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30 de outubro de 2009

A cultura das raves e a associação com religião

   Falo da minha experiência pessoal, da minha percepção de mundo, meu ponto de vista. Em nenhum momento afirmo que o que digo é realidade exata, nem sequer acredito que uma coisa tão abstrata quanto isso possa ter uma realidade única. É conceito, e conceito sobre os eventos existem muitos.
   Por muito tempo eu achei música eletrônica uma coisa chata. A repetição me angustiava e não conseguia entender como alguém podia gostar daquilo. Certa vez uns amigos me convenceram a ir à uma festa rave, chovia canivete, mas todos eles pareciam, ainda assim, animadíssimos a ir. Ranzinza como sou, reclamei um monte, mas eles acabaram me convencendo a ir. Decidi que, se eu ia nessa desgraça, que pelo menos ficasse seco. Comprei um guarda-chuva: entrei na loja e pedi o maior, e acabou sendo um daqueles de acompanhar gente até o carro, gigante.
   A experiência com a festa mudou minha percepção sobre tudo aquilo. Uma massa de gente transtornada, alterada pelo uso de alucinógenos interagia dançando uma música que parecia preencher o ambiente (o que era impressionante, já que era uma fazenda, um ambiente todo aberto). Foi nesse momento que eu finalmente entendi porque aquela música se chamava trance (em português transe, tipo transe hipinótico). A batida e os barulhos bagunçam a mente do usuário de alucinógenos, e de cara, prende uma multidão na caixa de som, literalmente em transe. Uma entidade pulsante que dança no compasso.
   Diversas vezes durante a noite, pessoas completamente desconhecidas, ensopadas, encontravam abrigo no meu guarda-chuva gigante e começavam a conversar, alucinando. Diversos espetáculos, malabaristas, dançarinos e performances. Em nenhuma outra festa eu tinha visto pessoas interagindo dessa forma.
   Porém, não antes de experimentar LSD, em outra ocasião, eu poderia entender aquilo de verdade. Estudos mostram que o LSD lembra poderosos químicos do cérebro usados na troca de mensagens entre células nervosas. A droga funciona como um falso sinal, perturbando o fluxo normal de informação. Um efeito específico é desligar uma parte do cérebro que filtra as informações que chegam dos orgãos dos sentidos. Uma inundação de sinais chega à conciencia e a experiência é uma estupefante sobrecarga de sensações.[LSD - The beyond within] Sinto que isso vem também do interior, quando sua mente bagunça informação de um lado pro outro, várias peças se encaixam ao mesmo tempo. Tudo isso aliado a sensação avassaladora de conciência do todo e de que você faz parte dele.





Albert Hofmann - pai do LSD

     Essa sensação de união com o todo foi levantada por muitos, principalmente na época dos hippies, como uma espécie de experiência  religiosa. Esta idéia foi combatida por vários teólogos do mundo, porém,  se olharmos por outro lado, a mescalina (extraida do cacto Peyote) "era usada inicialmente em rituais de várias tribos pré-hispânicas".[wikipédia] Em muitos aspectos, a "onda" da mescalina se assemelha à do LSD. "O pesquisador Robert Gordon Wasson, sugeriu que o cogumelo [amanita muscaria] está associado ao Soma, bebida sagrada dos Vedas, os mais antigos textos religiosos." Me parece que não é de hoje o uso de substâncias alucinógenas como meios para ter contato com outras realidades, distorcendo sua visão habitual do mundo e confrontando com uma realização de que o todo é maior que você e que você faz parte dele. Aliás, isso me cheira muito como um núcleo de várias religiões no mundo afora, a sensação de que há algo maior que nós, um todo que está em todo o lugar e tudo sabe. Gaia, Deus, seja lá quem for.



Amanita muscaria e Peyote

    Pois eu acredito que a cultura das raves vem sendo como um novo evento espiritual do ser humano. Algo com que a gente convive e conhece há muito tempo. União. Não sei se minha experiência é assim pelo grupo de amigos que tenho, mas já ouvi em outros lugares, que outras pessoas sentem o mesmo: união com o todo, com todo mundo. Tudo está em seu lugar, é assim que o mundo realmente é.
Lisergia.
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